As aventuras vividas como jornalista sempre me empolgaram e me surpreenderam pelas novas descobertas e, sobretudo, pela reação diferente de cada pessoa.
No final de fevereiro de 1996, estávamos na França, na cidade de Aix-En-Provence, distante 33 quilômetros de Marselha, em um programa da Ford, para lançamento de uma das últimas versões do Fiesta para o mercado europeu, e que alguns meses depois seria produzido também no Brasil.
No último dia do evento, fomos jantar em luxuoso restaurante da cidade, que tinha importantes clientes, entre os quais, uma das filhas do príncipe Rainier, de Mônaco, casado com a ex-atriz Grace Kelly.
Nos transportamos do hotel para o restaurante num automóvel Mondeo, um dos lançamentos mais recentes da época, que deixamos estacionado em uma praça. Eu estava na companhia de Bob Sharp, perfeccionista em tudo o que faz. Como piloto, jornalista e profissional polivalente da indústria automobilística, trabalhou na Volkswagen, General Motors, Gurgel, defendeu a equipe Ford e sempre assumiu responsabilidades nas áreas de engenharia, assistência técnica, produção, testes e o que fosse preciso.
Ao sairmos do restaurante para retornarmos ao hotel não encontramos o automóvel onde havíamos estacionado. Ele foi furtado, o que motivou um grande desconforto para os executivos da Ford que nos acompanhavam.
Por ser tarde da noite, não foi possível contato com a garage para pedir outro carro e saímos caminhando pela cidade em busca de um táxi. Em nossa caminhada, vimos um Mondeo igual ao que usamos para chegar ao restaurante e nos aproximamos para confirmar se era o mesmo automóvel.
Em razão da sequência de atentados a bomba que estavam ocorrendo em Paris, toda a França vivia assustada e o pessoal da Ford nos advertiu que não deveríamos nos aproximar do Mondeo.
Mas, devagar e com muito cuidado, fomos nos aproximando e reconhecemos o veículo, com a porta do motorista arrombada e o painel de instrumentos destroçado.
Foi quando descobri mais uma das virtudes de Bob Sharp. Enquanto o grupo conversava sobre a ocorrência, Bob Sharp, em silêncio, analisou todo o carro e percebeu os danos na porta, no painel de instrumentos e na coluna de direção.
Foi a nossa sorte. Mesmo com as advertências do pessoal da Ford, entrou no carro, sentou-se no banco do motorista e acabamos tendo uma noite diferente e emocionante, da qual Bob foi o nosso herói.
Ele percebeu que o objetivo tinha sido mesmo o furto do veículo e que algo havia ocorrido para que o abandonassem.
Sob a permanente preocupação de todos, especialmente dos executivos da Ford, com a calma que o caracteriza, Bob pegou o miolo do interruptor de ignição e partida, acionou-o com uma chave e, ligando a ignição, deu a partida no motor. Com o motor funcionando, colocou-o à disposição do motorista da Ford, que chamou todos para entrar no carro e voltar para o hotel.
Foi uma noite excitante. Primeiro, experimentando as sensações do furto, depois, a preocupação com um possível atentado, a torcida pelo êxito da iniciativa destemida de Bob e, por fim, o regresso ao hotel com a vivência de uma diferente e inédita história.
Quando deixamos o Brasil e vamos para a Europa, imaginamos que coisas como esta nunca vão ocorrer, ainda mais nos arredores de um requintado restaurante, muito visitado por turistas e personalidades.
Mais do que isso, são momentos como este que demonstram a versatilidade e rápida reação do brasileiro, em comparação com os mais risudos europeus.
Por segurança, se dependesse dos profissionais da Ford naquela noite, teríamos retornado para o hotel caminhando e teríamos deixado o Mondeo para que a polícia o encontrasse e fizesse todo o procedimento formal.
Ao contrário, surpreendemos e contrariamos os europeus e passamos por momentos divertidos e emocionantes, os quais podemos recordar até hoje, por mais que a memória muitas vezes falhem ou nos traiam.
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Fonte: Secco Consultoria;/ Crédito das imagens: Arquivo Internet