Coluna Mecânica Online | Recall de airbags mortais expõe falhas no atendimento e riscos à segurança no Brasil
Nos últimos cinco anos, mais de 700 campanhas de recall foram realizadas no Brasil, mas a baixa adesão e a demora na solução dos problemas deixam milhares de veículos em risco nas estradas, segundo a Secretaria Nacional do Consumidor (SENACON).
Quem me conhece sabe o quanto valorizo a segurança automotiva. É natural que o veículo que apresente mais recursos em segurança seja o mais desejado, apesar do apelo brasileiro por mais esportividade do que pela própria segurança.
A indústria automotiva é uma das mais cobradas e mostra, constantemente, sua evolução em oferecer mais recursos e tecnologias para tornar seus veículos mais seguros para motoristas, passageiros e o trânsito na totalidade.
Nos últimos cinco anos, os veículos brasileiros foram envolvidos em mais de 700 campanhas de recall. O mais alarmante desse número é a baixa participação dos proprietários no atendimento aos chamados. Ou seja, muitos carros estão circulando com risco grave de acidente em nossas estradas, segundo dados da Secretaria Nacional do Consumidor (SENACON). Desde 2020, os recalls que não forem atendidos em um ano ficam registrados no documento do veículo, conhecido como Certificado de Registro e Licenciamento do Veículo (CRLV). Essa medida foi adotada pelo governo para aumentar a segurança no trânsito.
Quando uma montadora de veículos confirma uma falha de segurança, o Denatran contata o proprietário do carro usando os dados do Renavam. Se o proprietário não responder, um aviso é registrado no documento do veículo, bloqueando a venda.
Agora, o mais grave disso tudo: a fabricante convoca um recall, o consumidor atende ao chamado e, ao tentar realizar o reparo, enfrenta dificuldades, seja em conseguir o agendamento, ou, mais crítico ainda, por não haver a peça de substituição disponível, deixando o consumidor esperando e ciente dos riscos ao continuar utilizando seu veículo. Ninguém quer arriscar!
Em abril, a Volkswagen convocou 13 modelos fabricados entre 2009 e 2013 para resolver o problema dos airbags mortais, que afeta Fox, CrossFox, SpaceFox, Gol, Saveiro, Voyage, Polo, Polo Sedan, Passat, Passat CC, Passat Variant, Multivan e Caravelle. O problema envolve uma falha no gerador de gás do airbag do motorista e/ou do passageiro.
Foi constatado que o propelente de um lote do gerador de gás pode se degradar após a exposição prolongada dos veículos a altas temperaturas, grandes variações térmicas e alta umidade, podendo levar ao rompimento do gerador de gás no caso de deflagração do airbag do motorista e/ou passageiro em um acidente. Nas unidades em que o gerador de gás do airbag se rompe, fragmentos metálicos podem ser projetados no interior do veículo, gerando risco de danos físicos ou fatais aos ocupantes.
Embora o recall tenha sido amplamente divulgado, muitos proprietários relatam grandes dificuldades em conseguir o reparo.
Segundo reclamações registradas no Reclame Aqui, os clientes enfrentam longas esperas para agendamento e, em alguns casos, a falta de peças de reposição.
No Reclame Aqui, encontrei clientes mencionando a dificuldade de conseguir agendamento na rede de concessionárias da Volkswagen (ID: 196731621), como o caso de um proprietário de Up TSI 2016 — também relacionado em um recall semelhante, em unidades fabricadas entre 19 de abril de 2013 e 17 de fevereiro de 2017 — que, desde junho, aguarda retorno para agendamento do reparo (ID: 196697429).
Há ainda alegações de falta de peças para substituição e longas filas de espera (IDs: 196628541, 196605223, 197521877, 197819669, 197377151, 197418455, 197542117, 197196031), além de casos em que apenas o airbag do passageiro foi trocado, e o do motorista ficou para posterior agendamento (ID: 197796401).
Entre as reclamações, é notável a preocupação dos proprietários dos veículos pela solução, enquanto enfrentam o descaso no atendimento.
“A Volkswagen do Brasil Indústria de Automóveis trata seus clientes com total descaso, colocando vidas em risco, pois, caso o airbag seja acionado, o motorista e/ou passageiro pode sofrer danos físicos ou fatais. Sem contar que meu veículo, Volkswagen Fox, está desvalorizado devido a esse problema não resolvido,” cita a reclamação ID: 197377151, de 13 de setembro.
Além dos atrasos, os proprietários expressam preocupação com a segurança de suas famílias, como nesse relato de 14 de setembro: “O recall é de alto risco, podendo causar danos físicos ou fatais, e esse é o carro que uso diariamente para transportar meus dois filhos, um de 4 anos e uma bebê de 9 meses. A falta de posicionamento da empresa me preocupa muito, por colocar minha família em risco!” (ID: 197418455).
“Como isso é possível? Uma marca tão renomada faz um recall, mas não tem a peça para pronta substituição. Uma peça que está colocando vidas em risco! Que absurdo! Vocês deveriam fornecer uma solução rápida para que ninguém seja afetado por essa situação. Tentei várias vezes entrar em contato com o SAC e não tive resposta”, relata uma reclamação de 16 de setembro (ID: 197542117).
Especialistas em defesa do consumidor alertam para a importância de cumprir os recalls com prontidão, evitando que os veículos continuem circulando com defeitos que podem resultar em acidentes fatais.
Segundo as associações de defesa do consumidor, é preciso estar atento para não ser vítima de falsos recalls. Algumas empresas convocam o recall, mas não fornecem as peças ou atrasam a substituição.
“Temos aí uma situação em que a empresa convoca o recall, mas não o realiza de fato. No entanto, com o chamamento público, ela pode se defender de problemas futuros, alegando que o consumidor não compareceu”, explica Daniel Mendes Santana, advogado do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec).
Se o consumidor perceber que o recall não está ocorrendo conforme o comunicado da empresa, deve denunciar a prática ao Procon local. Diante da denúncia, o órgão pode fiscalizar a prática da empresa e até multá-la, se necessário. “Quando uma empresa faz o chamamento de recall, ela precisa ter a peça em quantidade suficiente e disponível em todo o Brasil. Embora o CDC determine a reparação imediata, muitas decisões judiciais têm entendido que a empresa pode se preparar e formar estoque antes de convocar o consumidor, desde que isso não ofereça riscos ao consumidor”, explica Márcio Marccuti, diretor de fiscalização do Procon de São Paulo, em matéria publicada por Flávia Maia, em novembro de 2013.
No entendimento da Associação de Consumidores Proteste, após a convocação de um recall, a empresa tem 30 dias para trocar o produto ou a peça defeituosa. “Em caso de falha na prestação do serviço, como quando a empresa não realiza o recall corretamente, o fornecedor tem um mês para resolver o problema, pois está colocando em risco a vida e a coletividade”, defende Tatiana Viola de Queiroz, advogada da Proteste.
Se a empresa não cumprir o recall, o consumidor prejudicado pode pedir indenização.
“O artigo 12 do CDC determina que o fornecedor responda pelos defeitos e pela reparação do produto colocado no mercado. Por exemplo, se a campanha for de veículos automotores, o consumidor pode solicitar outro veículo ou até um táxi. Ele não pode ficar no prejuízo”, alerta Daniel, do Idec.
Em situações como essa, os consumidores devem ficar atentos e denunciar ao Procon quando o recall não é realizado conforme o comunicado da empresa.
Como consumidor, ao receber um chamamento de recall para seu veículo, você tem os seguintes direitos:
Reparo Gratuito: O fabricante deve realizar o reparo do defeito apontado sem qualquer custo para você, incluindo peças e mão de obra.
Informação Completa: Você tem o direito de ser informado detalhadamente sobre o problema identificado, os riscos envolvidos e as medidas que serão tomadas para solucioná-lo.
Transparência: O fabricante deve fornecer informações claras sobre o tempo estimado para o reparo e, se necessário, disponibilizar um veículo substituto durante o período em que seu carro estiver na oficina.
Comprovante de Serviço: Após o reparo, você tem direito a receber um comprovante detalhado dos serviços realizados, incluindo a descrição do problema, as peças substituídas e a garantia dos reparos efetuados.
Garantia: Caso o problema persista após o reparo, você pode solicitar a reexecução do serviço ou, em situações extremas, a substituição do veículo por outro de igual valor.
Lembre-se de exigir e guardar toda a documentação relacionada ao recall, incluindo notificações, comprovantes de reparo e qualquer comunicação com o fabricante ou concessionária.
Resumindo, se a empresa não realizar o recall corretamente, o consumidor tem o direito de exigir indenização e tomar medidas legais.
A Associação de Consumidores Proteste recomenda que, após a convocação, o fabricante resolva o problema em até 30 dias. Além disso, se o recall não for atendido em um ano, uma notificação será incluída no Certificado de Registro e Licenciamento do Veículo (CRLV), bloqueando a venda até que o reparo seja realizado.
FONTES – MAIA, Flávia. O que fazer quando a empresa não cumpre o recall?. Correio Braziliense, 2013. Disponível em: https://blogs.correiobraziliense.com.br/consumidor/o_que_fazer_quando_a_empresa_nao_cumpre_o_recall/. Acesso em: 20 setembro de 2024.
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